sexta-feira, 3 de abril de 2009

Nanã

Nanã Buruku, Nanã, Nanã Buluku, Nanã Buru, Nanã Boroucou, Nanã Borodo, Anamburucu, Nanã Borutu é o Vodun das chuvas, dos mangues, do pântano, da lama (barro molhado), senhora da Morte, e responsável pelos portais de entrada (reencarnação) e saída (desencarne). Identificado no jogo do merindilogun pelos odu ejilobon e representado materialmente e imaterial pelo candomblé, através do assentamento sagrado denominado igba nanã.

Em sua passagem pela Terra, foi a primeira Iyabá e a mais vaidosa, em nome da qual desprezou seu filho primogênito com Oxalá, Omulu, por ter nascido com várias doenças de pele. Não admitindo cuidar de uma criança assim, acabou abandonando-o no pântano. Sabendo disso, Oxalá condenou-a a ter mais filhos, os quais nasceriam anormais (Oxumarê, Ewá e Ossaim), e a baniu do reino, ordenando-lhe que fosse viver no mesmo lugar onde abandonou seu pobre filho, no pântano.

Nanã tornou-se uma das Iyabás mais temidas, tanto que em algumas tribos quando seu nome era pronunciado todos se jogavam ao chão. Senhora das doenças cancerígenas, está sempre ao lado do seu filho Omulu. Protetora dos idosos, desabrigados, doentes e deficientes visuais. É um vodun, segundo alguns pesquisadores, originário de Dassa-Zoumé, é uma velha divindade das águas. Pierre Verger encontrou um Templo Dassa-Zoumé e o sacerdote do seu culto.

A área que abrange seu culto é muito vasta e parece estender-se de leste, além do rio Níger, até a região Tapá, a oeste, além do rio Volta, nas regiões dos "guang", ao nordeste dos Ashanti.

Entre os fon e mahi ela é considerada uma divindade hermafrodita, anterior a Mawu e Lissá, aos quais teria dado origem em associação com a "serpente do Universo" Dan Aido Hwedo. Para os ewes e minas, ela é às vezes vista como um vodun masculino (Nana Densu), esposo da grande mãe das águas Mami Wata.

Nanã Buruku é cultuada no Candomblé Jeje como um vodun e no Candomblé Ketu como um orixá da chuva, das águas paradas, mangue, pântano, terra molhada, lama e considerada a mãe dos orixás Obaluaiyê, Iroko, Osanyin, Oxumarê e Yewá.

Nanã é chamada carinhosamente de "Avó", por ser usualmente imaginada como uma anciã. É cultuada em todo o Brasil nas religiões Afro-brasileiras. Seu emblema é o Ibiri que caracteriza sua relação com os espíritos ancestrais. Como "Mãe-Terra Primordial" dos grãos e dos mortos, Nanã Buruku poderia ser equiparada à deusa greco-romana Deméter-Ceres-Cíbele.

A existência do culto de Nanã Buruku é atribuída a tempos remotos, anteriores à descoberta do ferro, por isso, em seus rituais, não costumam ser utilizados objetos cortantes de metal.

O baobá ("Adansonia digitata L.", em iorubá ossê e em Fon akpassatin) é sua árvore sagrada.

No sincretismo afro-católico é Nanã Boroquê como é chamada na Umbanda é equiparada à Sant'Ana.

Qualidade de Nanã

Igbayin

Buruku

Igbónán

Asayio

Asanan

Insele

Tinoloko

Ajaosi

Ìkure

Cor: lilás e roxo

Metal: nenhum

Dia da semana: terça-feira

Predominância: morte, vida, reencarnação, medicina, doenças, chuvas, enchentes, deficiência visual, lama, manguezal, pessoas desabrigadas e idosas.

Saudação: Salubá Nanã!

Afirma-se que Nanã era a rainha de um povo e que tinha poder sobre os mortos. Para roubar esse poder, Oxalá desposou-a, mas não ligava para ela. Nanã, então, fez um feitiço para ter um filho. Tudo aconteceu como ela queria mas, por causa do feitiço, o filho, Omolu, nasceu todo deformado. Horrorizada, Nanã jogou-o no mar para que morresse. Como castigo pela crueldade, quando Nanã engravidou de novo, Orunmilá disse que o filho seria lindo mas se afastaria dela para correr mundo. Assim, nasceu Oxumaré, que durante seis meses do ano vive no céu como o arco-íris, e nos outros seis é uma cobra que se arrasta no chão.

Em outra lenda, conta-se que, na aldeia chefiada por Nanã, quando alguém cometia um crime, era amarrado a uma árvore. Nanã então chamava os Eguns para assustá-lo. Ambicionando esse poder, Oxalá foi visitar Nanã e deu-lhe uma poção que fez com que ela se apaixonasse por ele. Nanã dividiu o reino com ele, mas proibiu a sua entrada no Jardim dos Eguns. Oxalá então espionou-a e aprendeu o ritual de invocação dos mortos. Depois, disfarçando-se de mulher com as roupas de Nanã, foi ao jardim e ordenou aos Eguns que obedecessem "ao homem que vivia com ela" (ele mesmo). Quando Nanã descobriu o golpe, quis reagir mas, como estava apaixonada, acabou aceitando deixar o poder com o marido. Hoje no Culto aos Egungun só os homens são iniciados para invocar os Eguns.

Uma terceira lenda refere que, certa vez, os Orixás se reuniram e começaram a discutir qual deles seria o mais importante. A maioria apontava Ogum, considerando que ele é o Orixá do ferro, o que deu à humanidade o conhecimento sobre o preparo e uso das armas de guerra, dos instrumentos para agricultura, caça e pesca, e das facas para uso doméstico e ritual. Somente Nanã discordou e, para provar que Ogum não era tão importante assim, torceu com as próprias mãos o pescoço dos animais destinados ao sacrifício em seu ritual. É por isso que os sacrifícios para Nanã não podem ser feitos com instrumentos de metal.

Nanã Buruku é uma velhíssima divindade das águas, vinda de muito longe e há muito tempo.

Ogum é um poderoso chefe guerreiro que anda, sempre, à frente dos outros Imalés.

Eles vão, um dia, a uma reunião.

É a reunião dos duzentos Imalés da direita e dos quatrocentos Imalés da esquerda.

Eles discutem sobre seus poderes.

Eles falam muito sobre obatalá, aquele que criou os seres humanos.

Eles falam sobre Orunmilá, o senhor do destino dos homens.

Eles falam sobre Exú: "Ah! É um importante mensageiro!"

Eles falam muita coisa a respeito de Ogum.

Eles dizem: "É graças a seus instrumentos que nós podemos viver. Declaramos que é o mais importante entre nós!"

Nanã Buruku contesta então: "Não digam isto. Que importância tem, então, os trabalhos que ele realiza?"

Os demais orixás respondem: "É graças a seus instrumentos que trabalhamos pelo nosso alimento. É graças a seus instrumentos que cultivamos os campos. São eles que utilizamos para esquartejar."

Nanã conclui que não renderá homenagem a Ogum. "Por que não haverá um outro Imalé mais importante?"

Ogum diz: "Ah! Ah! Considerando que todos os outros Imalés me rendem homenagem, me parece justo, Nanã, que você também o faça."

Nanã responde que não reconhece sua superioridade. Ambos discutem assim por muito tempo.

Ogum perguntando: "Voce pretende que eu não seja indispensável?"

Nanã garatindo que isto ela podia afirmar dez vezes.

Ogum diz então: "Muito bem! Voce vai saber que eu sou indispensável para todas as coisas."

Nanã, por sua vez, declara que, a partir daquele dia, ela não utilizará absolutamente nada fabricado por Ogum e poderá, ainda assim, tudo realizar.

Ogum questiona: "Como voce fará? Voce não sabe que sou o proprietário de todos os metais? Estanho, chumbo, ferro, cobre. Eu os possuo todos."

Os filhos de Nanã eram caçadores. Para matar um animal, eles passaram a se servir de um pedaço de pau, afiado em forma de faca, para o esquartejar.

Os animais oferecidos a Nanã são mortos e decepados com instrumentos de madeira.

Não pode ser utilizada a faca de metal para cortar sua carne, por causa da disputa que, desde aquele dia, opôs Ogum a Nanã.


A cantora Daniela Mercury fez uma canção em homenagem à Iyalorixá Cleusa Millet, filha de Mãe Menininha do Gantois, no álbum Sol da Liberdade. O nome da canção é "Dara" e é interpretada em dueto com a cantora beninense Angélique Kidjo. Mãe Cleusa era filha de Nanã, e a sua voz ficou imortalizada em disco de Maria Bethania.

Nanã é a mãe primeira de toda humanidade, conforme a lenda o homem após várias tentativas de usar diversos materiais, foi feito do barro (lodo primordial das matérias na crosta terrestre), e soprado a vida em suas narinas por oxalá, sendo que a única restrição de Nanã foi para quando este homem morresse a sua matéria seria devolvida aos seus domínios, sincretizada como Nossa Senhora De Santana a avó de Jesus , dona das águas paradas, das chuvas e dos pantanos,ela decanta em seus domínios toda as matérias impuras dos homens, preparando assim a limpeza do espírito para próxima reencarnação.

Os Mistérios de Nanã

Mitos em torno do nascimento do orixá revelam traços de personalidade comuns aos que vivem sob sua proteção

Nanã, a mais velha deusa das águas, já estava com idade avançada quando decidiu que era hora de ter um filho. Mas ao pedir a ajuda de Ifá, ouviu do orixá da adivinhação o conselho de que desistisse da empreitada. Mesmo assim, a senhora dos pântanos e da lama decidiu seguir adiante: reuniu as oferendas necessárias para um ebó e engravidou. Na hora do parto, foi surpreendida pela aparência do filho, coberto por pequenas feridas.

“Demorei tanto para ter um bebê tão feio, antes fosse um bicho”, disse, antes de olhar para a segunda criança que também trazia no ventre. “Ah, este sim, é lindo!”, suspirou, sem ter tempo de pegar no colo a criança, que rapidamente transformou-se numa cobra de escamas douradas e desapareceu na floresta. Era Oxumarê, também simbolizado pelo arco-íris. Diante da aparência frágil do bebê adoentado, Nanã decide deixá-lo na beira do mar. “Pode ser que alguém queira cuidar dele... Ifá tinha razão”, constata, entristecida.
Apesar da decisão de não ficar com o bebê, a deusa dos pântanos nunca esqueceu completamente o filho.
De longe, observava se ele estava bem, cercado pelos cuidados maternais de Iemanjá. E, apesar de ter origem na região do Daomé, chegou a viajar até o território iorubá ao ouvir dizer que muitas crianças haviam morrido de lepra numa certa cidade, só para saber se Omolu estava entre os doentes.

Em outra versão, Omolu era considerado pouco sério e sempre estava na rua, em busca de alguma aventura galante, com o que pegou doenças horríveis. “Sua pele cobriu-se de pústulas. Nanã, sua mãe, enfureceu-se com ele, expulsou-o de casa e Yemoja acolheu-o e cuidou dele”, narra Verger no livro Notas sobre o culto aos orixás e voduns.

Essas são apenas duas das muitas histórias sobre a origem do Senhor da Terra. Mesmo com esse afastamento, Nanã possui grande influência sobre o filho. Um dos mistérios que envolvem Omolu diz que não se deve pedir nada diretamente ao orixá. “Para que ele não se sinta rejeitado, você não pode pedir beleza e saúde, mas o que ele possui: doenças, feridas, males”, explica a egbomi Cici. De acordo com alguns relatos, Obaluaiê entenderia tudo ao contrário. Outra alternativa, para quem precisa recorrer a seus favores, é pedir a ajuda da mãe do orixá. “Toda vez que você faz uma oferenda para Obaluaiê, os pedidos devem ser feitos por intermédio de Nanã”, diz Mauro Rossi, babá ewê e zelador da cada de Oxóssi do Ilê Axé Opô Aganju do Ilê Axé Opô Aganju. “Quando você pede a Nanã, ele atende sem precisar de dois pedidos. Ela é tão poderosa quanto ele, é a dona da vida e da morte, é a grande mãe e avó de todos nós. Qual o pedido de mãe que o filho não atende?”, questiona a ekéde Cinha.

Dogmas superados

Mas o amor de quem vive próximo ao orixá supera até mesmo alguns dos dogmas que o envolvem. Tanto que, apesar de todos os costumes, Agildo Leonardo Conceição garante nunca ter feito pedido “ao contrário” para seu orixá de cabeça. Iniciado há quase 30 nos mistérios da religiosidade de matriz africana, o antigo bancário afirma ter orgulho de ser filho do Senhor das Doenças. “Se ele é meu santo, eu tenho que confiar nele. Sinto um amor tão forte por ele, que às vezes chego a chorar. Se me dissessem: você vai voltar, de que santo gostaria de ser? Eu diria que dele mesmo”, afirma Agildo.

Assim como o orixá, Conceição teve a saúde debilitada na infância. Enfrentou febres, dores de garganta e tumores. Algumas de suas cicatrizes ainda permanecem espalhadas pelo corpo. Ele garante, entretanto, que depois de ter sido iniciado conquistou melhorias não apenas na saúde, mas na vida profissional. “Falar do meu santo é uma coisa muito sagrada, por causa do amor que eu tenho a ele. Não é uma coisa supérflua, é algo que vem de dentro do coração, uma energia positiva e grandiosa”, define.

Filho de Omolu, Agildo conhece bem o significado das pipocas, chamadas de doburus, que são consideradas a mais importante oferenda para o Rei da Terra. Como o conhecimento na religião dos orixás é transmitido oralmente, é comum se recorrer a narrativas para explicar a origem dos costumes e regras.

Expulso do território jeje devido as suas doenças, Omolu vai viver em terras iorubanas. Mas os habitantes da nação jeje caíram doentes, com um surto de varíola e sarampo. “Então o chamaram de volta, mas ele se recusou a retornar. Mandou que o povo pegasse todos os milhos, abrisse-os em flor e tomasse banho. E todos ficaram bons. A relação dele com o banho de flor é essa, como uma forma de se livrar das doenças, de conseguir a cura”.
As flores de Obaluaiê também indicam a hora do transe de seus filhos, nas festas realizadas nos terreiros. “Quando lança sobre seus convidados as pipocas, (Omolu) inaugura a chegada triunfal dos orixás na festa. O doburu indica o momento certo do transe. Pode também fazer alusão, de maneira metafórica, à ‘chuva que a todos purifica’”, descreve José Flávio Pessoa de Barros. Para os rituais religiosos e oferendas realizados em homenagem a ele, existe uma forma específica para o preparo da pipoca.

Para além do ambiente das festas sagradas, durante o pagamento de promessas feito no mês de agosto, nas ruas de Salvador e do Rio de Janeiro, sabe-se que alguns dos filhos do orixá podem incorporar a divindade ao receberem o banho de flor. Quem costuma sair à rua no mês de agosto em homenagem a Obaluaiê conhece, às vezes apenas pela forma de caminhar ou de se aproximar, um filho de Omolu. É o caso de Renata Ferreira de Jesus, 52 anos, ekéde do terreiro de Luís de Logun Edé, localizado no bairro do Cabula VI.

Na calçada em frente à Feira da Sete Portas, ela observa quando uma mulher se aproxima, deixa uma oferta em dinheiro para o orixá e afasta-se rapidamente. “Não quer um banho de flor?”, oferece, já enchendo as mãos com as pipocas, mas a mulher recua ainda mais, sorri quase sem graça, e vai embora com passos largos. “Vê? Era uma filha de Obaluaiê. Percebeu os braços arrepiados? Se eu jogasse a pipoca, o santo pegava”, diz Renata.

Nanã Buruku é o arquétipo das pessoas que agem com calma, benevolência, dignidade e gentileza. Das pessoas lentas no cumprimento de seus trabalhos e que julgam ter a eternidade à sua frente para acabar seus afazeres. Elas gostam das crianças e educam-nas, talvez, com excesso de doçura e mansidão, pois têm tendência a se comportarem com a indulgência dos avós. Agem com segurança e majestade. Suas reações bem equilibradas e a pertinência de suas decisões mantêm-nas sempre no caminho da sabedoria e da justiça.

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